quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Jurema - Uma história baseada

Como se engordasse um porco pra comê-lo no Natal
Eu tinha uma plantinha.

Eram algumas sementes
Nasceram 2 brotos
Na encubadora, o maior não resistiu
a outra vingou
e foi.

A cada dia mais ela crescia
Duas folhas para cá,
Duas folhas para lá.
Um galinho para cá.
Duas pontas, três pontas, cinco pontas
E a moça espichando, posava pra fotos
E voltei a pensar no Natal;
Em enchê-la de bolinhas
Pisca-piscas, lantejoulas
E por que não salivar com suas flores?
Afinal, o que é Natal sem presentes?

E lá ia eu ao Largo do Machado atrás de fortificantes,
fertilizantes
terras adubadíssimas com minhocas e tudo.

E bota a bicha no sol da manhã na janela da frente,
E bota a bicha na área pra pegar o sol da tarde,
E bota a bicha na janela do quarto pro pôr do sol dar mais um grau,
E bota a bicha pra dormir com a luz ligada,
Adorava calor e luz.

E foi crescendo Jureminha assim batizada,
podada e mimada.

Metro e meio.
Só folhão.
Pensei: Quanto maior o vaso, mais a planta crescerá!
Suas raízes relaxarão em mais espaço
e essa casa, filhotinha, tá pequena pra você.
Papai vai la na rua, comprar-te um vaso bem bonito, tá?

Escolhi.
Aquilo não era apenas um vaso
Era uma mansão de plástico
Cor de telha,
Fosca,
mais alguns quilos de terra - da boa -
e mais um novo fertilizante que o conterrâneo me indicou.

Vamos à mudança:

Forra a mesa com jornal
Delicadamente
Faca serrada.
O plástico do quitinete onde a Jura (é... apelido carinhoso) se instalava dava pra cortar com jeito
e fui eu devagarzinho
pra mantê-la o mais intacta
cortando o plastiquinho
cuidadoso, com cuidado de transplantador de órgãos.
Calma.

Quando ouvi:
-Ih João... né assim não!!!!

Choque.

Pois é assim sim.

- É aqui, ó...

E mete a mão no pescoço dela
entortando alguns caulinhos
balançando pra folgar da terra
e arrancando à força média
e aumentando a força enfim
e mordendo o lábio pra puxar com raiva
vão quebrando suas raízes
e meus olhos se esbugalham
cada "crec" dói na alma
e rebentou igual aipim.

paro.

respiro.

...

não

vai dar certo.

tem que dar. Ela sabe o que faz...

nó na garganta.

No novo vaso a terra já a espera.
Replantada.
Água pra ela, água pra ela...
Sobreviverá. Tenho fé.
E na UTI vê-se que as folhas já murcharam.

Tentei.

E bota a bicha no sol da manhã na janela da frente,
E bota a bicha na área pra pegar o sol da tarde,
E bota a bicha na janela do quarto pro pôr do sol dar mais um grau,
E bota a bicha pra dormir com a luz ligada.

e mais alguns dias depois já estava acinzentada e nem florar ela florou

Numa dessas, na janela eu a sentia já tristonha.
E pensava: Poxa vida... se continuasse no seu antigo habitat ela estaria mais feliz.
Mas foi por um bom motivo, tentamos melhorar.
Agora está ai:
na janela
ao fim da tarde,
improvisadamente escorada pelo negócio feito para repousar cavaquinhos, não vasos de planta
Perigosamente declinada pra fora do prédio
Sem nenhuma grade
Sem nenhum apoio.
Qual será o seu destino, broto valente que virou quase árvore?

Ela me olhou,
-juro-
suspirou,
e foi.
do sexto andar.

E ecoou no vale dos prédios o seu último grito
e o trombolho de mais de cinco quilos
de terra,
e o vaso,
e a porra toda; um esporro.
Lá embaixo ela toda torta, espatifada

Vou correr pra te salvar!!!!
E desço os 6 andares com a escada de alumínio na mão

-Vizinho, por favor me ajude!
Ouviu o barulho?
Ela caiu no seu telhado!

-Ih, é, aê...Podes creeer, brother! Acho que ouvi alguma coisa sim vinda lá de trás mermo, aê....shooow, aê...Podes creeer!

-Trouxe a escada pro resgate!

- Pode crer...Pô, relaxa, aê... Tranquilão, Johnny... quem foi que caiu?

- A Jurema!!

- Pode crer.... a neném? Tá com quantos meses já ela?

- Não, velho!  A planta! Abre a porta logo!!!!

- Pode crer....Pô, Johnny... essa parada aí é pequena pra subir lá na parada lá, brother... vai ter que esperar o porteiro chegar amanhã pra pegar a...a....(fazendo o gesto com a mão, como se estivesse subindo) como é o nome mesmo?

-  A escada?

- É!!! ha ha ...Pode crer... a escada maior lá, pra ver lá...

Então, triste, subi
Os amigos me consolaram.
A saudade veio em lágrimas... fui deitar pra esquecer.

No dia seguinte ao olhar da janela tudo limpo.
Já não havia mais terra na laje
Já não havia mais vaso
Já não havia mais ela.

E do sexto andar eu sentia
todo dia
de noitinha
mais um pouco do seu crematório
e toma-lhe Reggae Night na caxanga do vizinho.

Jureminha, a suicida, que saudade de você!







terça-feira, 13 de setembro de 2011

De Areia

Areia é pó de pedra e concha
Que desmancha se castelo
Vai ao mar, tapete eterno
Firme chão dos oceanos

E os anos esmigalham
Do deserto
Ao concreto
Grão discreto
Construção.

Dentro da ampulheta
Sente o tempo sem ser hora
Sem demora
Muda as dunas
Vai ao vento
Sem razão

Ver em vidro, reconheço:
Muito aqueço pra ser fraco
Pra ser caco
Basta pedra
Recomeço o recomeço
Se aos olhos incomodo
Assoprou, desapareço

...